O que difere o vício do hábito é o dano
Um poema e uma música
O que difere o vício do hábito é o dano,
então pra me tirar a saudade só rehab.
Caminho na masmorra do castelo há anos
e o vício é não saber que é classe média.
Ibuprofeno é o vício habitual no bolso,
me ancoro no Cefalium que remanesce.
O hábito de ver o rosto dela no Whats
virou vício de almejar o que não posso:
posso ir vê-la mas não posso possui-la.
O que houve com tudo que era nosso?
Nunca houve tanto dano quanto agora.
A cabeça dói, onde fica o occipital?
Não reclamo pra ninguém da enxaqueca
e se eu jazer vai ser sozinho — normal.
Elenco meus vícios no bloco de notas
pois nem sei mais se tenho segredos:
o humor pesado e o relevo das costas,
a postura ereta e o sorriso ao degredo,
os comprimidos que eu tanto detesto
e não tomo por ódio e por medo.
O meu maior vício é arrancar plaquetas,
fibrinas e glóbulos brancos a esmo
pra impedir que a cicatriz desapareça
e outra mexa com minha tez e nervos.
Se não me julgo digno de perdão
o fado é a proximidade de quem odeia
e a eterna distância de quem me ama?
Essa dama não clareia minha visão -
a torna turva como o fermentar das uvas,
candeia apagada torna tudo escuridão.
Um gole todo dia será que dano causa?
Dar mole todo dia é abrir demais as asas?
Buscar noutras o que não obtive em uma
é hábito almejado ou vício no passado?
Na dúvida entre hábito e vício
cicatrizar ou me manter ferido
me culpar ou me julgar digno
opto pela permanente inconstância
fragmentado e fractal:
me sentencio a não repetir erros
mas tampouco manter acertos.
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